segunda-feira, 30 de maio de 2011

Santa Joana d'Arc, a Donzela de Orleans - Festejada 30 de maio

     A 30 de maio de 1431, véspera de Corpus Christi, uma jovem era conduzida para a Praça do Mercado Velho, em Rouen. Amarraram-na ao alto da pilha de lenha, onde o fogo deveria ser ateado. Pendia-lhe da cabeça um papel com a inscrição "herética, relapsa, apóstata e idólatra".
     Numerosa multidão cercava a praça. Seiscentos soldados ingleses montavam a guarda. Chegada ao local da execução, ela pediu uma cruz. Um soldado inglês quebrou a haste da lança em duas partes, amarrou-as em forma de cruz e entregou-lha. De posse do precioso emblema, foi amarrada ao poste. Então, a jovem clamou alto por São Miguel. O algoz chegou o facho à lenha molhada com azeite e o fogo alastrou-se com fúria, de baixo para cima.
     Assim que as labaredas a envolveram, a jovem bradou com força, para reafirmar fidelidade à sua missão: "Não me enganei, as vozes eram do céu". Enquanto as chamas devoravam seu corpo, reafirmou que agira "por ordem de Deus". Por fim, o grito prolongado enquanto inclinava a cabeça e rendia sua alma à Deus: "Jesus!".
     Em poucos minutos tudo terminara. As cinzas da fogueira foram varridas para as águas do Sena. Até o coração da donzela, que as chamas haviam poupado, foi lançado ao rio. A donzela não tinha completado 20 anos!
* * *
     A Igreja vivia então a profunda crise do grande Cisma do Ocidente, que durou quase 40 anos. Quando Catarina de Siena faleceu, em 1380, havia um Papa e um antipapa; quando Joana nasceu, em 1412, havia um Papa e dois antipapas. Ao mesmo tempo em que havia tal laceração no interior da Igreja – quem sabe como consequência desta situação aflitiva em que as almas deviam se sentir perplexas e sem rumo – se davam contínuas guerras fratricidas entre os povos cristãos da Europa, das quais a mais dramática foi a Guerra dos cem anos entre a França e a Inglaterra.
     Deus suscitou esta donzela confiando-lhe um encargo pouco comum: transformada em guerreira, deveria salvar a França! Ela atravessou o território inimigo para ir à Chinon, onde se encontra com o delfim. Convenceu-o da missão recebida através das vozes que ouvia. Ela declarou: "Nasci para isto!". Em apenas oito dias (de 1 a 8 de maio de 1429) a pastora libertou Orleans, alcançou sobre os exércitos ingleses a fulminante vitória de Patay e conduziu o delfim Carlos a Reims para ser coroado rei a 17 de julho de 1429.
     Esta santa francesa bem como Santa Catarina de Sena, padroeira da Itália e da Europa, são talvez as figuras mais emblemáticas das “mulheres fortes” do final da Idade Média. São duas jovens do povo, leigas e consagradas na virgindade; não vivem no claustro, mas no meio das realidades dramáticas da Igreja e do mundo da sua época.
     Joana d'Arc nasceu em Domrémy, Champagne, em 1412. O pai de Joana, Jaques d’Arc, era um camponês e Joana nunca aprendeu a ler ou a escrever.
     Ela teve a sua primeira experiência mística aos 13 ou 14 anos: ouviu uma voz acompanhada de uma luz que a chamava. Ela recebeu as visões quando cuidava das ovelhas do seu pai. Visões posteriores eram compostas de mais vozes e ela foi capaz de identificar as vozes como sendo de São Miguel, Santa Catarina e Santa Margarida.
     Em 1428 suas mensagens tinham um fim específico: se apresentar a Robert Baudricourt, Senhor de Vaucouleurs, que comandava o exército do delfim Carlos na região. Baudricourt duvidou dela, mas quando chegaram as notícias de sérias derrotas nas batalhas de Herrings, do lado de fora de Orleans, em fevereiro de 1429, exatamente conforme Joana havia predito, modificou sua posição.
     Ele enviou Joana com uma escolta para falar com o delfim Carlos; ela escolheu viajar com roupas de homem para sua própria proteção. Em Chinon, o delfim Carlos se disfarçara, mas ela o identificou no meio dos cortesãos, e o convenceu a acreditar na origem divina das suas visões e da sua missão.
     Ela pediu uma tropa de soldados para ir a Orleans. O seu pedido foi muito questionado na corte e ela foi enviada a Poitiers para ser examinada por um grupo de teólogos. Após um exame de três semanas, os teólogos aconselharam o delfim Carlos a atender os pedidos de Joana. Foi-lhe então dada a tropa e um estandarte especial feito para ela, com a inscrição "Jesus - Maria" e o símbolo da Santíssima Trindade, no qual dois anjos apresentavam a ela uma flor de lis. Joana vestia uma armadura branca.
     Sua tropa entrou em Orleans em 29 de abril. Sua presença revigorou Orleans, e em 8 de maio as forças inglesas que cercavam a cidade foram capturadas. Seguiu-se a sagração de Carlos VII, da qual Joana participou com sua armadura, sua espada e seu estandarte.
     No auge de suas vitórias, Joana foi procurada certa ocasião por seus conterrâneos que lhe perguntaram de onde ela tirava tanta coragem. Ela respondeu: "Só temo a traição". O primeiro grande traidor foi o próprio Rei Carlos VII, que se deixou vencer pela inércia e abandonou a heroína à sua própria sorte na tentativa de reconquistar Paris, bem como em suas outras escaramuças com os inimigos.
     Daí em diante sem suporte e sem a presença do rei, Joana sofreu várias derrotas. O ataque a Paris falhou e ela foi ferida na coxa. Durante a trégua de inverno, Joana ficou na corte onde ela continuava sendo vista com ceticismo.
     Quando as hostilidades recomeçaram, ela foi para Compiègne onde os franceses estavam resistindo ao cerco dos Borguinhões. A ponte movediça foi fechada muito cedo: Joana e suas troas ficaram do lado de fora. Ela foi capturada e levada ao Duque de Burgundy em 24 de maio, ficando prisioneira até o fim do outono. Carlos VII não fez nenhum esforço para libertá-la.
     Ela havia previsto que o castelo seria entregue aos ingleses e assim aconteceu. Ela foi vendida aos líderes ingleses na negociação. Os ingleses estavam determinados a ficarem livres do poder que Joana exercia sobre os soldados franceses. Como os ingleses estavam em guerra, não podiam executá-la. Eles então imaginaram uma maneira de julgá-la como herege.
     Em 21 de fevereiro de 1431, Joana compareceu diante de um tribunal liderado por Pière Cauchon, bispo de Beauvais. Este bispo francês fora expulso de sua diocese na marcha triunfal da Donzela e alimentava um ódio indizível contra ela. Além disso, esperava tornar-se Arcebispo de Rouen com a ajuda dos ingleses.
     Ela foi interrogada sobre as vozes, sua fé e sua vestimenta masculina. Sessenta juízes, clérigos e advogados, todos pagos pelo governo inglês, reuniram-se em Rouen. Um dos juízes, Houppeville, que protestou de início contra o processo, porque apenas inimigos da Donzela iam julgá-la, foi lançado no cárcere. Outro juiz, que pediu um defensor para Joana d'Arc, fugiu apressadamente da cidade quando os ingleses queimaram uma mulher só porque era favorável à Donzela.
     Apesar de todas as irregularidades, a Donzela lançou por terra todas as argúcias dos juizes durante o processo. Às perguntas capciosas ela dava respostas cheias de sabedoria.
     Quando lhe perguntaram: "Credes que estais na graça de Deus?" Se dissesse que não, confirmaria que suas revelações não eram do Céu; se dissesse que sim, estaria expressando uma heresia. Ela respondeu simplesmente: "Se não estou, que Deus me coloque; e se estou, que Deus me conserve". E acrescentou: "Eu seria a pessoa mais amargurada do mundo se soubesse que não estou na graça de Deus".
     Quanto a questões relativas ao segredo que ela compartilhava com Carlos VII, ela disse: "Durante três semanas, em Chinon e Poitiers, fui examinada por pessoas da Igreja. Enviai alguém a Poitiers para procurar os documentos do processo". Cada vez que ela mencionava esse episódio, os juizes mudavam de assunto, pois o fato de a santa ter sido examinada e justificada pelo tribunal de Poitiers incomodava enormemente a corte de Rouen.
     Em outra ocasião, propuseram à Donzela um conselheiro. Ela respondeu: "Em relação ao conselheiro que vós me ofereceis, eu vos agradeço, mas eu não tenho a intenção de me afastar do conselho de Nosso Senhor".
     Ao lhe perguntarem se Deus detestava os ingleses, a santa observou: "Quanto ao amor ou ódio que Deus sente pelos ingleses, nada sei. Mas o que bem sei é que eles serão expulsos da França, exceto os que aqui morrerem".
     "Quereis vos submeter à nossa Santa Madre Igreja por tudo o que fizestes, quer de bem ou de mal?", perguntaram-lhe os juizes. Santa Joana d'Arc respondeu: "Quanto à Igreja eu a amo, e quereria sustentá-la com todas as minhas forças".
     Por três meses de prolongou o interrogatório. Os ingleses temendo que a santa morresse devido aos maus tratos, apressaram o julgamento. Cauchon condenou-a a morrer na fogueira.
     O testemunho dado por ela na hora da morte, dizendo: "Não me enganei, as vozes eram do céu", era um supremo lance de heroísmo. Ele valia mais do que a entrada triunfal em Reims, ao lado do rei que ia ser coroado, a entrada triunfal heróica em Orleans, ou tudo o mais. Ela lançava em face de seus algozes que não morria como herética, mas como vítima do ódio de seus inimigos.
     Aquele tribunal irregular não era verdadeiro representante da Igreja, essa mesma Igreja que haveria de proceder à reabilitação de Joana d'Arc e elevá-la aos altares. Em 1456, sua mãe e dois irmãos apelaram para a reabertura do caso, com o que o Papa Calisto III concordou. O julgamento e o veredicto foram anulados.
     A França encontrou sua identidade, venceu os opositores, graças à ação da Donzela. Após sua morte, a França recuperaria sua identidade; ela despertara na alma dos franceses o ideal que fizera da França a filha primogênita da Igreja. E quão providencial foi sua missão! Caso a França ficasse sob a tutela da Inglaterra, que no século seguinte se rebelaria contra a Igreja Católica, correria o risco de resvalar também para a heresia.
     Popularmente venerada por séculos, Santa Joana d'Arc foi finalmente beatificada em 1909, e canonizada em 1920 como virgem e mártir. Ela ficou conhecida como La Pucelle d'Orleans, a Virgem de Orleans, e foi declarada oficialmente padroeira da França em 1922.

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