sábado, 1 de outubro de 2011

Santa Teresinha do Menino Jesus, Carmelita e Doutora - Festa 1 de outubro

A personalidade de Santa Teresinha em duas fotografias
     Alguém poderia objetar que, para ter sede das almas, é preciso senti-las. Como é que se sentem, como é que se percebem as almas? Qual é a atitude ordenada que a pessoa deve ter diante da alma que percebe?
     Para que essa questão muito importante ficasse bem clara, achei que nada seria melhor do que trazer aqui esta magnífica fotografia de Santa Teresinha do Menino Jesus. É realmente magnífica; falta apenas o relevo, para se dizer que ela está viva.
     Para comentar essa alma, eu pediria um esforço um pouco singular, que é o seguinte: não prestar tanta atenção no que irei dizendo, mas em si mesmos. Procurarei explicitar, não o que eu penso de Santa Teresinha, mas o que uns tantos ou quantos pensam dela. Quer dizer, que impressão a visão desta fotografia produz em uns tantos ou quantos.
Primeira impressão
     A primeira impressão, ao olhar para ela, é a seguinte: Que menina! A primeira explicitação, o primeiro jorro, deve ser assim. Ela é ainda menininha, cheia de vida, de frescor, saltitante, e com essa espécie de extroversão própria de uma menina ainda na infância. Aí se vê a beleza de uma alma de criança, na delicadeza, na fragilidade, na louçania da natureza feminina. Como essa fotografia é bem apanhada, e como pegou bem essa menina! Essa é a primeira impressão.
Idéia de pureza
     Por detrás dessa impressão entra uma outra, pela qual a pessoa reconhece tudo aquilo, mas ao mesmo tempo em que se embevece com a inocência, com a vivacidade e a louçania dessa menina, sente uma idéia de pureza associada a isso. E sente-a mais ou menos em tudo. A pureza vem presente, antes de tudo, no seguinte: nota-se nela, no sentido verdadeiro da palavra, uma boa espontaneidade.
     É uma menina que não esconde nada, que não tem o hábito de esconder nada, e que sabe perfeitamente que não tem o que esconder. Ela não tem fraude nem dissimulação. Dela se pode dizer o que Nosso Senhor disse de Natanael: "Aqui está um verdadeiro israelita, no qual não há fraude" (Jo. 1, 47). Aqui está uma verdadeira menina, pura, filha de uma família católica, que tem em si toda a pureza, toda a candura de uma vida de família católica, toda aquela delicadeza virginal que a vida de família católica comunica especialmente a uma menina. E isso sem fraude nenhuma. Ela tem isso inteira, e não tem o hábito de pecar.
A infância meditativa
     Era uma criança altamente meditativa. No fim da vida, quando estava madura para o Céu, e portanto quando tinha atingido a santidade a que a havia destinado o desígnio da Providência, ela contava que quando tinha por volta dos dez anos - quer dizer, um pouquinho mais velha do que está aqui - ia com a irmã a um belvedere lá dos Buissonnets, e tinham conversas em que ela recebia tantas ou mais graças do que as que receberam Santo Agostinho e Santa Mônica no famoso colóquio da hospedaria de Óstia, pouco antes de Santa Mônica morrer. Portanto, quando a santidade de Santa Mônica estava consumada, e ela estava para ir para o Céu.
     No fundo, nota-se isso no olhar dela. Não se pode descrever um olhar. Se se perguntasse a São Pedro o que lhe disse o olhar de Nosso Senhor, o que poderia ele responder? Responderia: "Ele disse algo por onde eu chorei a vida inteira. As lágrimas mais amargas e mais doces que jamais se choraram, depois das de Nossa Senhora, chorei-as eu". E não teria outra coisa para dizer, pois o olhar é algo de inefável.
A principal etapa da vida
    Quero insistir sobre o seguinte ponto: Santa Teresinha morreu aos 24 anos, e se volta muito para a sua infância. Essa época marcou tão profundamente os rumos de sua vida, que é a mais ilustrativa para se conhecer o seu espírito. Tenho impressão de que na vida de Santa Teresinha os pontos culminantes são a sua infância e o fim, às vésperas da morte.
     Aqui está, a meu ver, um elemento precioso para o conceito de infância espiritual. Não é bobeira, não é tolice, muito menos irreflexão. É, de dentro de uma alma pequena, de uma alma de criança, ser capaz das maiores coisas; com uma apresentação amável, afável e autêntica, não a pura apresentação do espírito de uma criança. Aqui está a questão, e aqui, a meu ver, está a nota: Santa Teresinha poderia repetir que as nossas cogitações e as nossas vias não são as dela.
     Mas não é o que ela nos diria. A sua missão é a de, pela sua presença, e como num "flash", apresentar a via dela e atrair, arrastar para a sua via. E isso com o afável, com o pequeno, o acessível, o encantador que a infância tem. Mas que infância meditativa! Que infância fecunda! Uma infância que se pode comparar ao fim da vida de Santa Mônica! É uma santa falando de si mesma.
     Aí se vêem os tesouros de maturidade, de meditação, de profundidade, e, se necessário for, de atividade, que cabem dentro da verdadeira infância espiritual. Foi ela quem disse: "Para o amor nada é impossível". Em nossa linguagem isso se traduz: "Para o enlevo, para o zelo do verdadeiro católico, nada é impossível". (¹)
 
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     "Ecce in pace amaritudo mea amarissima". Essa frase do Rei Ezequias (Isai. 38, 17) costuma ser transcrita junto a estampas representando Nosso Senhor ou Nossa Senhora durante a Paixão.
     Quem sabe vislumbrar através dos traços de uma fisionomia um estado de alma não pode deixar de pensar que essas palavras mereceriam estar escritas ao pé desta segunda fotografia, que nos mostra uma figura sorridente, mas indizivelmente dolorosa.
     O sorriso não procura esconder a dor, mas afirmar-se por um prodígio de virtude, de fidelidade à graça, apesar da dor. Os lábios sorriem só porque a vontade quer que eles sorriam, e a vontade o quer porque essa alma tem fé, e sabe que depois das provações e das trevas desta vida terá como prêmio Aquele que disse de Si: "Serei Eu mesmo vossa recompensa demasiadamente grande" (Gen. 15, 1). Essa recompensa será Aquele de quem Santa Teresa de Ávila proclamou: "Ainda que não houvesse Céu eu Vos amara, ainda que não houvesse inferno eu Vos temera". Nessa alma há ordem, e há aquela tranqüilidade inconfundível que vem da ordem: apesar de um oceano de dor, há verdadeira paz.
    De um oceano de dor, dizíamos. Um desses oceanos de aridez e sofrimento tão grandes que não cabem na terra, e só em uma alma católica e generosa podem caber.
     Vítima do Amor misericordioso, Santa Teresinha se oferecera em holocausto, e esse holocausto fora aceito. Ela estava a dois passos da morte, por efeito de uma moléstia implacável, e provas interiores misteriosas e terríveis enchiam sua alma. Dias antes de morrer, escreveu. "O demônio anda em volta de mim: não o vejo, mas sinto-o, porque me está atormentando e segurando-me com mão de ferro, sem me deixar o menor alívio, para com a força das dores me fazer desesperar... Quão necessária é aquela oração de completas: "Livrai-nos, Senhor, dos fantasmas da noite" (História de uma Alma, cap. XII).
     É toda essa dor que se exprime no olhar luminoso e triste, que parece chorar enquanto os lábios sorriem. É uma tristeza ordenada, sem revolta, nem sentimentalismo, nem vaidade. Uma tristeza que na mera criatura lembra o divino modelo da tristeza profunda, mas santamente sujeita à vontade divina, do Cordeiro de Deus.
     Junto à Santa, dois símbolos: o lírio e a cruz fria e nua de Nosso Senhor Jesus Cristo.     Aí está a tranqüilidade da ordem, em meio à aridez e à dor. E ainda aqui, se poderia dizer à humanidade: "Se conhecesses o dom de Deus..." (Jo. 4, 10).
*   *   *
     Se todas as almas, na alegria como na dor, procurassem a paz verdadeira, então sim, o mundo teria essa paz que lhe poderá dar. Mas, dirá alguém, isto é para Freiras. Objeção ignóbil e ridícula, como a do indivíduo que vendo um regimento desfilar com garbo ou morrer com bravura, dissesse: "Patriotismo não é comigo. É coisa para soldado". (²)
 
Fontes:
(¹) Plinio Corrêa de Oliveira, Conferência maio de 1968 (excertos);
(²) Plínio Corrêa de Oliveira, Catolicismo Nº 111 - Março de 1960 (excertos).

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