quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Santa Ângela Merici, Fundadora - Festejada 27 de janeiro

     Santa Ângela Merici viveu na época em que o tristemente célebre Martinho Lutero pregava a desobediência à Cátedra de Pedro e a rebelião contra a Igreja Católica. O Renascimento corroborava com os desmandos dos pseudo-reformistas. Deus suscitou então donzelas que levantariam o pendão da pureza e da virgindade numa época em que a corrupção era ostentada com despudor e petulância. Ângela foi a alma dessa verdadeira reforma dos costumes.
     Ângela Merici nasceu em 21 de março de 1470, num pequeno porto de pescadores na margem meridional do Lago de Garda (Norte da Itália) chamado Desenzano. Sua família era pobre, mas piedosa. De sua mãe sabe-se apenas seu nome de família, Biancosi, originária da cidade de Salò.
     Ela não freqüentou escolas. Seu pai reunia todas as noites os filhos e os servidores para as orações e para a leitura de alguma passagem piedosa. Ângela demonstrou desde cedo muita atração por tais leituras e decidiu seguir a via da santidade.
     O traço dominante de sua personalidade era uma extraordinária pureza. Desde a mais tenra idade dedicava-se a uma intensa mortificação, limitando-se apenas ao necessário. Jamais imaginou outro destino para sua vida do que a de permanecer virgem.
     Aos treze anos, ainda sob a ação das consolações que recebeu na sua Primeira Comunhão, uma grande provação a atingiu: o falecimento de seu pai, modelo de homem católico. Dois anos após, sua mãe também falecia.
     Ângela e sua irmã foram confiadas a um tio materno, em Salò. As duas jovens viviam em casa do tio num tal recolhimento, que eram conhecidas por todos pelo nome "as duas rolinhas de Salò". A profunda amizade que unia as duas irmãs durou pouco: a irmã também deixou esta terra.
Sua missão
     Tendo morrido seu tio, Ângela retornou à Desenzano com o intuito de consagrar-se à instrução religiosa da mocidade feminina.
     No ano de 1506, Deus lhe fez conhecer Seu desígnio sobre ela. Certo dia, quando trabalhava no campo, por volta do meio-dia separou-se um pouco das jovens que a acompanhavam para rezar sozinha entre as vinhas. Numa visão, foi-lhe apresentado um número incontável de virgens rodeadas de luz celeste, trazendo coroas na cabeça e lírios nas mãos, que subiam uma escada que ia da terra ao céu. Anjos, cujos instrumentos enchiam o ar de sons, acompanhavam as virgens, e os movimentos se fundiam numa espécie de apoteose da pureza sem mancha.
     Uma delas, que Ângela reconheceu como uma amiga falecida, se destacou dentre as companheiras e lhe disse: "Ângela, saiba que Deus te concedeu esta visão para indicar que, antes de morrer, tu deverás fundar em Bréscia uma sociedade de Virgens semelhantes a estas que vês; tal é a disposição da Providência a teu respeito".
     Ângela estava ainda em êxtase, quando suas jovens amigas a encontraram. Por inspiração divina, contou a elas a visão que tivera, bem como a missão que recebera de Deus. Tocadas pela graça, as jovens desejaram segui-la nessa via. Ela porem não conhecia Bréscia nem as pessoas que lá moravam, mas estava certa que a fundação se faria lá. Ela decidiu esperar a ocasião suscitada por Deus para isso.
     A espera prolongou-se por dez anos, durante os quais sua atividade apostólica se intensificou e se ampliou. Ângela tinha uma graça natural, uma suavidade sorridente, uma afabilidade constante que lhe bastavam para atrair os corações. Deus abençoou o seu apostolado: as famílias confiavam-lhe a educação das filhas e sua fama espalhou-se tão rapidamente, que ela era conhecida por toda região.
     Durante esses dez anosum núcleo de discípulos se formou em torno dela. Entre eles, Jerônimo Pentagola e sua esposa Catarina ocupavam lugar de destaque.
     Em 1516, os Pentagola perderam seus dois filhos, com breve intervalo entre os falecimentos. Como nada os pudesse consolar em sua imensa dor, pensaram em Ângela. Pediram-lhe então, com insistência, que lhes concedesse a graça de sua presença na casa onde moravam, em Bréscia.
     Foi assim que Ângela se dirigiu a Bréscia. A fama de sua santidade lá se difundiu tanto quanto em sua cidade natal ou em Salò.
Ciência infundida pelo Espírito Santo
     Devido à ação do Espírito Santo sobre a alma de Ângela, que ignorava as letras e as ciências humanas, de repente ela foi capaz de ler, não somente em italiano, mas também em latim; comentava a teologia, especialmente a teologia mística, de tal sorte que lia não apenas nos textos, mas nas próprias almas, que eram para ela como livros abertos.
     Em vista disso, aos visitantes habituais, as notabilidades e o bom povo de Bréscia, se juntaram caravanas de eruditos, teólogos, legistas, diretores de consciência e filósofos. Nem uma só vez, durante os minuciosos interrogatórios a que era submetida, Ângela caiu em erro. A ciência infusa daquela mulher humilde causava admiração em todos. A sua integridade doutrinária contrapunha-se aos erros de Lutero, que dividiam a Cristandade.
     A guerra entre o rei da França, Francisco I, e o futuro Imperador alemão, Carlos V, estendia-se por todas as províncias italianas do Norte. Em meio àqueles conflitos, Ângela se esmerou em opor ao sensualismo a pureza virginal, e à heresia uma dócil e total submissão à ortodoxia doutrinária.
Em Roma, com o Papa
     Por ocasião do ano jubilar de 1525, a Santa fez uma peregrinação a Roma. O Papa Clemente VII recebeu-a em audiência, tomou conhecimento da visão que ela tivera em 1506 e da missão que recebera de Deus. Ele examinou os seus projetos e, convencido da origem sobrenatural dessa missão, o Papa abençoou a sua obra.
     Pouco depois de seu regresso, foi obrigada a deixar novamente a cidade ameaçada de pilhagem em conseqüência das devastações que a guerra fazia em todo o norte da Itália. Parte então para Cremona como refugiada com seus amigos mais próximos. Durante o êxodo é sua força de alma que ergue os abatidos, animando-os e consolando a todos.
     Em Cremona também a procuram no lugar onde reside. O próprio duque Francesco Sforza, de Milão, também refugiado em Cremona, recebe de Ângela a direção espiritual iniciada pouco antes em Bréscia.
     Em 23 de dezembro de 1529, a paz é assinada em Cambrai e Carlos V é sagrado Imperador pelo Papa Clemente VII. Ângela pôde então voltar a Bréscia.
As companheiras da Santa Fundadora
A fundação
     É chegada a hora de cumprir o que lhe fora indicado na visão. Vinte e quatro anos haviam se passado (1506-1530). No ano de 1530, reuniu as doze moças que escolhera para serem o núcleo original da Companhia de Virgens que tinha por missão fundar.
     Ângela tinha em mente uma congregação totalmente diferente do que até então tinha havido: não procurou um lugar para instalar um convento para aí residir com suas religiosas, mas apenas um local onde elas pudessem reunir-se para receber uma orientação adequada e fazer certas orações em comum.
     Suas filhas espirituais continuariam a residir em suas próprias casas, no mundo, para ali serem exemplo eloqüente de uma virtude tipicamente contra-revolucionária: a pureza. Elas combateriam a dissolução dos costumes no próprio âmbito familiar e social; não seriam religiosas de clausura, mas deveriam praticar uma pureza ilibada e virginal, vencendo o mundo em seu próprio reduto.
     Embora a vigilância pela conservação dos bons costumes fosse a principal meta de sua obra, suas filhas trabalhariam também na instrução religiosa, na assistência aos pobres e enfermos. Mais tarde seu instituto tomaria a feição de Ordem religiosa, com clausura e votos. Mas o fim conservou-se o mesmo: a educação da mocidade. Foi o primeiro instituto religioso de ensino na Europa.
     Em 25 de novembro de 1535 já eram 27 as virgens reunidas em torno de Ângela. No ano seguinte ela submeteu a Regra da nova sociedade ao Cardeal Francesco Cornaro, bispo de Bréscia, que a aprovou em 8 de agosto de 1536.
     Ângela foi eleita Superiora Geral por unanimidade, apesar dos protestos de sua humildade. Ela fez entretanto duas exigências: a de não ser apontada como Fundadora, e a de colocar o novo Instituto sob o patrocínio de Santa Úrsula. Ela esperava assim ver seu nome desaparecer, substituído pelo da gloriosa padroeira, virgem e mártir.
     Até sua morte, ocorrida em 27 de janeiro de 1540, Ângela continuou a ser um modelo perfeito de santidade para suas filhas espirituais.
     Após ter indicado a Condessa Lucrécia Lodroni como sua sucessora e reunindo em torno de si as 150 virgens que formavam sua Companhia, entregou a alma ao Criador, não sem antes recomendar expressamente a suas filhas:
     "Obedecendo a vossas superioras é a mim mesmo que obedecereis; e, ao me obedecer, obedecereis a Jesus Cristo, cuja misericordiosa bondade me escolheu para ser, viva ou morta, a Mãe desta Companhia, ainda que, de mim mesma, fosse muito indigna disso".
     A notícia de seu falecimento espalhou-se rapidamente por toda a região e uma multidão participou de seu sepultamento, que se realizou no dia seguinte. Seus santos despojos foram sepultados na Igreja de Santa Afra. Nessa ocasião, durante três noites consecutivas apareceu no céu uma estrela de brilho extraordinário, cujos raios convergiam para o ponto onde estava o corpo.
     É interessante notar a similitude da obra de Ângela com a de Santo Inácio de Loyola: ambos fundaram Ordens com o nome de companhia. Assim como o nome Companhia de Jesus indicava seu caráter militante, o nome do instituto fundado por Santa Ângela indicava sua luta contra o sensualismo renascentista.
     Ela foi beatificada em 1768 e o Papa Pio VII a canonizou em 1807. É festejada a 27 de janeiro.
 
Fonte: G. Bernoville, Sainte Angèle Merici; Les Ursulines de France et l'Union Romaine, Bernard Grasset Éd., Paris, 1947.

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